Fonte: DW-World Brazil
A Basílica do Santo Sepulcro, em Jerusalém foi construída centenas de anos atrás em Jerusalém, no local onde se acredita que Jesus Cristo tenha sido crucificado. Na administração dessa igreja, um fato chama a atenção: suas chaves encontram-se nas mãos de uma família muçulmana.
Isto se estabeleceu, em parte, como forma de os líderes islâmicos da época mostrarem soberania sobre o cristianismo; em parte pelo fato de os diferentes grupos cristãos dificilmente concordarem sobre qualquer assunto.
Complexo ritual
Duas horas depois do pôr-do-sol, os peregrinos são convocados pela última vez a deixar a igreja, antes que as portas sejam fechadas. Os monges que moram na igreja sabem que precisam voltar a tempo, do contrário terão que encontrar outro local para pernoitar.
Trancar a basílica no final do dia é um ritual complicado. Depois de cerrada a porta de madeira maciça, um monge no interior passa uma escada pela abertura construída especialmente com este fim, permitindo que um homem do lado de fora alcance as fechaduras da parte superior. Esse procedimento tem sido seguido há centenas de anos.
O muçulmano Nuseibeh Wajih conhece sua função na Basílica: “Eu sou o porteiro e o guardião da igreja. Isso começou no século 7º, 1.300 anos atrás”. Ele vive fora das muralhas da cidade velha, mas precisa abrir a igreja diariamente às 4h da manhã. Para ele, não é problema levantar cedo: Jesus não é somente para os cristãos, mas sim para todos.
A igreja foi construída em torno do túmulo de onde se acredita que Cristo ressuscitou. Monges franciscanos o contornam, em sua procissão diária. O padre franciscano Fergus Clarke, que mora na igreja há mais de cinco anos, explica por que as chaves estão nas mãos de uma família muçulmana: segundo ele, os líderes da época queriam mostrar a superioridade do Islamismo sobre o cristianismo. “Eles fecharam todas as portas, menos uma, e assim podiam controlar a única entrada à igreja mais importante da Cristandade.”
Seis famílias numa cozinha
Porém há um outro motivo: as seis denominações cristãs que compartilham a casa de oração dificilmente chegam a um acordo sobre diversas questões práticas como, por exemplo, reparos ou até mesmo a limpeza da igreja. Há também o temor de que se um grupo tiver a chave, os outros possam ser impedidos de entrar. Uma situação no mínimo delicada, observa Wajih Nusseibeh: “Todo o mundo acredita que é o proprietário da igreja, e quem é dono pode fazer o que quiser: pode fazer entrar o seu pessoal e deixar os outros de fora”.
Monges armênio-ortodoxos iniciam sua procissão ao redor do túmulo, com os monges católicos pouco à frente. É como duas óperas encenadas lado a lado, uma competição para os ouvidos de Deus. O padre Clarke comenta:
“É certamente difícil, para quem não está acostumado. Nós, que vivemos dentro, na verdade mal ouvimos. Este é o único templo cristão do mundo onde Igrejas orientais e ocidentais cultuam o mesmo Deus, sob o mesmo teto, ao mesmo tempo. Agora, imagine se você colocar seis famílias numa mesma cozinha. Será preciso estabelecer diretrizes e limites. E se todos têm uma festa de aniversário no mesmo dia, ao mesmo tempo, naturalmente haverá divergência de opiniões”, exemplifica.
Religião e punhos
Porém, às vezes, essas diferenças de opinião geram violência, como aconteceu durante uma procissão de Páscoa, três anos atrás. Monges ortodoxos gregos e armênios se enfrentaram aos socos. Na época, dois religiosos foram presos e dois hospitalizados. Como a maioria das disputas, esta também foi por território: um grupo cristão temendo que o outro estivesse tentando invadir uma área que não lhe pertencia.
“Não há dúvida de que desentendimentos como este podem acontecer de tempos em tempos. Nós nos sentimos envergonhados quando isso acontece. Mas imagine que nos demais 360 dias do ano existe cooperação, dadas as diferenças de idioma e cultura. É um milagre que tudo corra tão bem”, comenta Clarke.
A Basílica do Santo Sepulcro, em Jerusalém, é visitada por peregrinos de todo o mundo. A emoção dos fiéis é visível, principalmente quando tocam a pedra onde se acredita que esteve o corpo de Jesus Cristo depois de ter sido crucificado. Os peregrinos que desconhecem as rivalidades locais sentem-se inspirados pelo milagre do Natal e pela mensagem de paz e amor que Cristo veio para trazer – até este local do planeta.
Autora: Irris Makler (br)
Revisão: Augusto Valente
Revisão: Augusto Valente
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