Folha de São Paulo
Tyson Balcomb, aluno da Universidade Estadual de Portland, decidiu sair do Facebook depois de um encontro acidental em um elevador. Ele viu-se diante de uma mulher que não conhecia pessoalmente –mas, pelo Facebook, ele sabia que cara o irmão mais velho dela tinha, que ela era de uma pequena ilha ao largo da costa do Estado de Washington e que havia recentemente visitado a Space Needle em Seattle.
“Eu sabia todas essas coisas sobre ela, e nunca havíamos nos falado”, conta Balcomb, que está fazendo graduação em medicina no Oregon e tem alguns amigos reais em comum com a mulher. “E comecei a pensar que aquilo talvez não fosse muito saudável.”
The New York Times | ||
Enquanto o Facebook prepara sua muito aguardada oferta pública inicial de ações, está ansioso por mostrar ímpeto aproveitando seu imenso quadro de assinantes: mais de 800 milhões de usuários ativos em todo o mundo, segundo a empresa, e 200 milhões nos Estados Unidos, ou dois terços da população do país.
Mas a empresa começa a esbarrar em um obstáculo, entre os norte-americanos. Algumas pessoas, mesmo entre os mais jovens, simplesmente se recusam a participar, e entre elas estão algumas que chegaram a experimentar o serviço.
Um dos principais argumentos de venda do Facebook é que ele permite criar elos mais próximos entre amigos e colegas. Mas algumas das pessoas que preferem ficar fora do site afirmam que ele pode ter o efeito oposto e fazer com que se sintam mais, e não menos, alienadas.
“Eu deixei de telefonar para meus amigos”, diz Asleigh Elser, 24, que está fazendo pós-graduação em Charlotesville, Virgínia. “Limitava-me a ver suas fotos e atualizações e achava que desse modo estava conectada a eles”.
É certo que uma vida sem Facebook tem desvantagens em uma era na qual as pessoas anunciam toda espécie de marcos pessoais importantes na web. Elser perdeu convites e fotos de bebês recém-nascidos postados por amigos. Mas nada disso a incomodou tanto quanto a distância que, segundo Elser, sua conta no Facebook criava entre ela e os amigos. E por isso decidiu fechá-la.
Muitas das pessoas que preferem ficar fora do serviço mencionam preocupações quanto à privacidade. Os estudiosos das redes sociais afirmam que é tudo uma questão de confiança. Amanda Lenhart, que dirige pesquisas sobre adolescentes, crianças e famílias no Pew Internet and American Life Project, diz que as pessoas que usam o Facebook tendem a “em geral confiar nas outras pessoas e nas instituições”. E acrescenta que “algumas pessoas tomam a decisão de não usar o serviço porque temem o que poderia acontecer”.
Lenhart aponta que cerca de 16% dos norte-americanos não têm celulares. “Sempre haverá quem resista”, diz.
Steve Dykes/The New York Times | ||
Tyson Balcomb, estudante que decidiu deixar o Facebook depois de um encontro acidental em um elevador |
Os executivos do Facebook afirmam não esperar que todos os norte-americanos assinem o serviço. Em lugar disso, estão desenvolvendo maneiras de manter os atuais usuários por mais tempo no site, o que oferece à empresa oportunidade de lhes mostrar mais anúncios. E o maior crescimento do serviço agora ocorre em regiões como a Ásia e a América Latina, onde talvez ainda existam pessoas que nunca ouviram falar do Facebook.
“Nosso objetivo é oferecer às pessoas uma maneira útil, divertida e gratuita de se conectar com os amigos, e espero que tenhamos apelo para uma ampla audiência”, diz Jonathan Thaw, porta-voz do Facebook.
Mas os números quanto ao crescimento do site nos Estados Unidos são sombrios. O número de norte-americanos que visitaram o Facebook caiu em 10% nos 12 meses até outubro –depois de um crescimento de 56% no mesmo período um ano atrás, de acordo com a comScore, que monitora o tráfego de internet.
Ray Valdes, analista do Gartner, diz que essa desaceleração não era uma questão crucial para a oferta pública inicial da companhia, que pode acontecer no segundo trimestre. O que importa, diz, é a capacidade do Facebook para manter seus milhões de usuários atuais entretidos e interessados em retornar.
“É provável que estejam mais preocupados com a perda do entusiasmo inicial dos assinantes”, diz Valdes. “É um problema que precisam resolver continuamente, e não existe solução permanente.”
Erika Gable, 29, que vive em Brooklyn e faz relações públicas para restaurantes, nunca viu graça no Facebook. Ela diz que a conversa cotidiana que o site traz –atualizações sobre dias de cabelo ruim ou fotos do que foi comido em um jantar– é simplesmente lixo virtual que ela não quer acumular em sua vida.
“Se eu tiver vontade de ver o segundo filho da minha prima em quinto grau, ligo para ela”, diz, rindo.
Gable não tem aversão à tecnologia. Usa um iPhone e ocasionalmente o Twitter. Mas quando o assunto é criar um perfil na maior rede social do mundo, os limites de sua tolerância são excedidos.
“Lembro de usar o Myspace por algum tempo e de sempre me sentir esquisita quando via informações sobre os outros o tempo todo”, diz. “Não é algo que me interesse.”
Todd Heisler/The New York Times | ||
Erika Gable, que se recusa a entrar no Facebook, mas usa serviços de mídia social como o Twitter |
Will Brennan, 26, do Brooklyn, diz que ouviu “muitas histórias de horror” sobre os problemas de privacidade do Facebook. Mas conta que os amigos nem sempre aceitam com simpatia sua postura de rejeição às mídias sociais.
“Recebo convites para o Facebook pelo menos duas vezes por mês”, diz Brennan. “E tenho de ouvir resmungos por arruinar os planos de alguém porque não estou no Facebook.”
E quer os amigos reclamem, quer não, dizem as pessoas que preferem viver sem Facebook, essa decisão parece ser assunto quente para conversas –mais ou menos como a decisão de não ter um televisor seria, em outra era.
“As pessoas sempre ficam espantadas”, diz Chris Munns, 29, administrador de sistemas em Nova York. “Mas minha vida funciona bem sem ele. Não sou recluso. Tenho amigos e uma vida agradável em Manhattan, e por isso não acho que haja algo faltando em minha vida.”
Mas a pressão dos colegas só vai aumentar. Susan Etlinger, analista do Altimeter Group, diz que a sociedade está adotando novos comportamentos e expectativas diante da quase onipresença do Facebook e de outras redes sociais.
“As pessoas podem começar a perguntar por que as pessoas que não participam das redes sociais decidiram agir assim. Será que estão escondendo alguma coisa?”, ela diz. “As normas estão mudando.”
Essa forma de raciocínio funciona nos dois sentidos para aqueles que escolhem não usar o Facebook. Munns diz que sua vida amorosa se beneficiou do fato de ele não ter um dossiê on-line. “As pessoas não têm a oportunidade de vasculhar sua vida toda no Facebook antes de um encontro.”
Mas Gable diz que essas verificações de antecedentes são a única coisa de que ela precisa no Facebook.
“Se estou interessada em um cara, peço a uma amiga para olhar”, diz Gable. “Mas não vou além disso.”
Tradução de PAULO MIGLIACCI
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