Folha de São Paulo
Pães,  bolachas, leite e café, muito café, em plena madrugada de sábado. Cerca  de 30 jovens encaram esse lanche reforçado num casarão da rua  Avanhandava, região central. O destino deles é o Baixo Augusta,  vizinhança cheia de atrações à noite, entre bares fuleiros, moderninhos e  prostíbulos decadentes.
| Maria do Carmo/Folhapress | 
|  | 
| Jovem religiosa da missão Thalita Kum, que evangeliza pelas calçadas da rua Augusta, atrás de jovens “pecadores” | 
No “esquenta”, a cerveja dá lugar à oração. A tarefa não é descolar um paquera ou dançar até o chão. Os  jovens fazem parte da missão católica Thalita Kum (”levanta-te”, em  hebraico) e saem pela madrugada com o intuito de tirar outros da vida  profana.
A  missão integra o grupo Aliança da Misericórdia, criada há 12 anos por  dois padres. Com sede em São Paulo, hoje está presente em 36 cidades do  país e do exterior. Também faz parte da Aliança a missão Maria Madalena,  cujos itinerários incluem bailes funk e pontos de prostituição na  região de Perus, na zona norte da capital.
Em  comum, as duas turmas largaram o conforto familiar pelo voto de  pobreza. Entre as tarefas que devem cumprir está morar em uma favela por  alguns meses para saber como é passar pelas dificuldades do local.
Fazer  parte da missão também exige disciplina. Além do voto de pobreza, é  necessário viver em comunidade num curso preparatório de três anos.  “Meus pais não aceitaram quando eu vim de Indaiatuba para morar aqui com  o meu irmão. Agora, até pensam em se mudar para cá”, diz Rafael  Menezes, 24.
O  celibato não é obrigatório. Quando um deles se apaixona por outro, o  orientador deve ser avisado. Se for recíproco, fazem votos de namoro,  vão morar em endereços distintos e ganham o direito de se encontrarem  sozinhos eventualmente. Após o casamento, vão morar em uma das casas  dentro das comunidades, separados dos demais -uma prática comum.
Mesmo  com tantas restrições, ainda há atividades mais “descoladas”, como as  idas à Cristoteca, espécie de discoteca gospel localizada em bairros  como o Brás, na região central, onde não entram bebidas alcoólicas.
| Maria do Carmo/Folhapress | ||
|  | ||
| Jovens da missão católica Thalita Kum durante oração de aquecimento para a pregação noturna entre turmas de baladeiros | 
Saindo por aí
Os jovens fiéis moram em comunidades coletivas, como a da rua Avanhandava, visitada pela reportagem durante a incursão baladeira. Antes de sair pela vizinhança, eles formam um círculo de oração numa das capelas do espaço. O intuito é o de se proteger de eventuais represálias e pedir iluminação divina para a empreitada, que inclui “livrar os jovens de vícios”, como a bebida, o sexo fácil, as drogas e outros pecados.
Os jovens fiéis moram em comunidades coletivas, como a da rua Avanhandava, visitada pela reportagem durante a incursão baladeira. Antes de sair pela vizinhança, eles formam um círculo de oração numa das capelas do espaço. O intuito é o de se proteger de eventuais represálias e pedir iluminação divina para a empreitada, que inclui “livrar os jovens de vícios”, como a bebida, o sexo fácil, as drogas e outros pecados.
Durante  a visita, a reportagem foi surpreendida: todos juntaram as mãos em  oração por este texto. Ainda na comunidade eles trocam histórias sobre  outras passagens noturnas pela Augusta, que inclui relatos de uma  prostituta arrependida e de uma adolescente de 14 anos que perdeu os  pais e saía pelos clubes bebendo até cair. As narrativas de sucesso das  evangelizações dão ânimo aos presentes para encarar a maratona cristã.
Os  preparativos também incluem pinturas divertidas nos rostos dos mais  empolgados. Os músicos afinam o violão e o grupo já organiza quais serão  os trios que formarão durante a caminhada. Ninguém pode se perder ou  ficar só. As portas se abrem e todos saem pela rua sem se intimidar.
“Já  aconteceu de vizinhos jogarem água na gente. É comum tirarem sarro na  rua, mas não estamos nem aí”, conta Adriana Garcia de Aguiar, 29,  fonoaudióloga que largou o diploma e o aconchego da casa dos pais em  Piracicaba, cidade do interior paulista, para viver religiosamente,  assim como a maioria dos seus irmãos de fé. A profissão? Não exerce  mais.
Apesar  de a região do Baixo Augusta ser famosa por ataques homofóbicos e de  intolerância, essa turma jamais sofreu atos de violência -a oração do  esquenta deve ser forte.
Sem  pena do gogó, começa a cantoria. Os integrantes cantam alto hinos de  louvor e frases como “Jesus te ama”. As palavras ressoam como um choque  térmico nos ouvidos de quem está bebericando um drinque nos bares e  inferninhos.
Olhares surpresos
“Socorro,  o que é isso, pelo amor de Deus?”, pergunta a publicitária Juliana  Canhadas, 28, frequentadora da região que assistia perplexa à romaria  dançante. A explicação dada pela reportagem não é suficiente para tirar a  expressão de assombro da moça.
Grande  parte reage dessa forma. Começa a subida, piadinhas são ouvidas aos  montes, ao mesmo tempo em que eles interagem em clima informal com quem  está aberto a conversar. Sobram olhares surpresos. Afinal, o grupo  percorre a rua aos pulos e, não raro, empunham uma santa gigante que  entrecorta o trajeto pecaminoso.
Alguns  se rendem à doçura da turma, como as garotas de programa da região. E  as piadinhas acabam se transformando em pedidos de oração.
SERVIÇO
Para conhecer a missão Thalita Kum, não é preciso agendar horário.
Casa Cenáculo-Emannuel
R. Avanhandava, 616, Bela Vista, SP, tel. 0/xx/11/3237-3061.
www.misericordia.com.br
R. Avanhandava, 616, Bela Vista, SP, tel. 0/xx/11/3237-3061.
www.misericordia.com.br
 
 

Nenhum comentário:
Postar um comentário